quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009
alguém está cozinhando a tarde morna
Então me alimento de gestos já feitos, para que novos trabalhos? Não entendo e não quero, tenho horror a encomendas sejam elas quais forem. Não entendem? Estes desenhos não foram feitos em preto porque são modernos. Eu estava de luto. Acabara de saber que havia morrido na semana anterior meu terapeuta. Não vai haver mais sessão, meu terapeuta havia entrado na UTI e em três dias se foi. Ele pediu para não avisar antes, explicou a secretária. Acho que queria que a morte dele não me pertencesse afinal, que não fosse o assunto, apenas ele não estaria mais lá para me atender, acho que era isso. O figura foi bom até mesmo para morrer, que classe, sabia a importância do seu lugar e mais do que ninguém sabia me colocar no meu. O que mais fazer? Foram-se todos os papéis brancos de uma vez, fiz a série e não mais desenhei. Porque escolhí a escrita. Agora me digam porque voltar a desenhar, invadir outras paredes porque as minhas já estão repletas e não preciso de mais nenhum motivo. Não? mais ser artista é tão chique, alguém que se considera acima e no mais das vezes está tão pra baixo. Admiro estas pessoas que vão ao trabalho todos os dias, mas eu me sinto péssima assim, ter de trabalhar é como não dar nada de mim. Preconceitos. O sonho da noite me invade agora. Entrar no mercado, essa coisa toda que merda é essa, afinal. Fora isso, aprecio olhar e refletir sobre a mesma coisa, pouco me importa que o jornal seja de ontem ou de um ano atrás e o mesmo vale para o meu trabalho, que assim chamo mas é algo que está mais em mim que no mundo. E o sempre adiado portfolio, porque ele é uma reverberação de mim mesma, mil vezes alterada, mil vezes repensada, mil e irritantes vezes patricia desnorteada. patriciab, com minúsculo mesmo, havia escrito um dia e gostei. meu lado b, inventar a outra, a que não é a patricia. ser a outra de mim mesma. E o portfolio da artista. Projeto único. Como se viver não ultrapassasse isso tudo. Eu falo demais. Cheiro de pão pelo ar tão bom, alguém está cozinhando a tarde morna.
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Um comentário:
patriciab, como a gente se reinventa?
eu tento todo o dia e, por desgosto, acabo em mim mesmo. Como aquele verniz ruím que, no começo está lá, envolvendo a porcelana. Depois racha, se solta e cai. Embaixo, a velha porcelana, como foi feita, no fogo original.
Eu iniciava essas fracassadas tentativas por uma pergunta: onde você quer estar agora?
viver ultrapassa tudo isso. Triste é não saber a resposta para a melhor das perguntas: "onde você gostaria de estar agora?". Ora, é bem mais fácil do que "o que você gostaria de ser? o que quer que aconteça com você? o que você vai fazer agora?" etc e tal. Mas, nem todos tem essa resposta à mais simples das perguntas. A bem da verdade, eu nem essa tinha, há algum tempo. Como diz você, as vezes (quase sempre) a gente está bem pra baixo. Quantos, além de mim, não poderiam estar nesse seu texto?
Quando conclui sua escrita, depois de tantas coisas, no gesto simples - o cheiro do pão -, é a grande resposta a terrível pergunta: "onde voce gostaria de estar agora?". Na rua que me criei, atrás da escola, no primeiro amasso, na aula de desenho, quando abri o caderno novinho com folhas em branco, imaginando como iria enche-la com minhas figuras, o desenho da rua e da casa, do cachorro colorido - que poderia usar todos os lápis de cor, ou mesmo todas as canetinhas silva-pens - ah, sim, a caixa com vinte e quatro!-;junto com alguém que se gosta.
(gosta e admira. O ser apaixonado é pegajoso, aceito. mas admiração é bom: tem gente que me admira [acredite se quizer]e eu não vejo por onde.)
Mas não basta estar lá. A vida sempre ultrapassa o prazer que ela nos acena. Logo vem mais: "o que você gosta de fazer". Difícil: o que eu tenho que fazer eu sei, afinal, não fui eu quem decidiu. E tem um monte de coisas a fazer. Não, não tem: nada é, realmente importante. O mundo funciona sem você. Só você não funciona sem você.
Porque, inferno, a gente tem que depender da gente? Temos que fazer o que gostamos. Escreva, deixe as imagens. Elas vão existir sem você.
Você quer existir sem as pessoas. Você vai existir, assim como as pessoas sem você. É essa merda toda, esse sonho que te invade.
Essa merda toda
história um: Um músico da frança barroca, filho de sapateiro, se torna um arrivista. Para descobrir o segredo do maior compositor da época, que tocava viola da gamba com suas duas filhas, seduz não uma delas, mas as duas. Seu intento: se aproximar do pai, o compositor, famoso por sua reclusão e intransigência. Depois de transformar a vida das filhas num mar de desgosto, devido a sua canalhiçe, ele consegue se apropriar de algumas técnicas de composição do famoso violoncelista. Mesmo se tornando um compositor famoso, mais tarde, ele sabe que suas obras não ombreiam nem a sombra do velho compositor, já aposentado, acabado pela trsieza de suas filhas.
Um dia, durante um concerto para a aristocracia que lhe sustentava, recebe um chamado: o velho compositor o chamava. Ele sabia o por quê: uma das filhas se suicidara. Mesmo assim ele vai. Ao encontrar o compositor, velho, na mais simples das casas, por ele é inquirido: "Você sabe porque suas músicas são inferiores?". "Não, me explique". "O que pretende dizer com ela?" "O brilho eterno das estrelas!" "Não", vocifera o velho. "A beleza de todas as mulheres" "Não!" "O amor infinito", "a beleza das formas", "o sentido da vida" e assim por diante. O velho já nem mais respondia, seu oçhar queimava e desesperava o jovem compositor. A cada justificativa, o desespero e o remorso tomava conta de sua pessoa. Em prantos, com o coração despedaçado de tristeza, remorso, arrependimento, humilhação, pergunta: "deus, o que minha música deveria dizer? me responda!". O velho se aproxima e lhe diz: "agora você sabe. O que é?" E o jovem, em frangalhos lhe responde: "o cheiro do couro da uma sola de um sapato".
moral: é a resposta da pergunta, que eu fazia; parece também o final do seu texto, que parece a resposta da sua pergunta. Esta 'desnorteada', mas tomar água, com bolo e sentir o cheiro do pão lhe proporciona todo o prazer. Queria eu ter uma resposta assim, simples.
história dois: um repórter procura um mendigo para produzir uma entrevista. Abordando, combina a entrevista com o mendigão, que aceita, claro.
"onde vc mora?"
"aqui, nesse banco. Mas para a entrevista, vamos para o meu banco predileto", e tocaram para o banco em frente, na praça.
O reporter, constrangido, pergunta:
"então porque vc não mora aqui?"
"para ter um lugar aonde ir!"
moral dessa história: é bom ter um lugar aonde ir, se possível fora de sp, há uns vinte minutos, não mais
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